Mecânico recebe R$.20.000,00 de horas extras pelo tempo gasto limpando as mãos – tempo à disposição e tempo de tolerância

Boa Tarde!

   O Buncando Direitos esteve ausente nos últimos meses, mas agora retomaremos as matérias, trazendo semanalmente informações úteis a todos  nossos leitores!

    Hoje vamos falar de um recente e interessante julgamento no âmbito do Direito do Trabalho.  Um mecânico que trabalhava na Goodyear, na cidade de Americana-SP, tinha que gastar trinta minutos, após o expediente, para tirar toda a graxa de suas mãos e braços, antes de ir embora. Ele já havia batido o cartão de ponto quando começava a se limpar. Em ação trabalhista pediu que esses trinta minutos diários fossem remunerados como horas extras! Ele tem razão?

Vamos ao caso

(CLIQUE AQUI)

O caso

   O Reclamante trabalhou como Mecânico da Goodyear de Americana-SP. Para trabalhar, recebia equipamentos de segurança, luvas, macacão, etc. Mas, o óleo e a graxa, muito manuseados, atravessavam as luvas, encardindo as mãos do trabalhador.  Quando encerrava o seu expediente, registrava o cartão de ponto, e se dirigia para o vestiário, onde gastava cerca de meia hora para conseguir se limpar.

  Quando saiu da empresa, entrou com reclamação trabalhista, pedindo, entre outros direitos, cerca de R$.20.000,00 (vinte mil reais) por hora extras referentes à esses trinta minutos diários em que ficava se limpando. Sustentou que, mesmo já tendo registrado seu horário de saída, ainda estava em tempo à disposição do empregador, e que só ficava para que pudesse ir limpo para casa.

   Em primeira e  segunda instâncias seu pedido foi negado. Entendeu-se que, como o empregado já havia batido seu cartão de ponto, e como se limpar nas dependências da empresa não era obrigatório, então não havia motivos para considerar esses minutos como horas extras, pois não seriam horas à disposição do empregador, muito menos horas trabalhadas. Como um dos fundamentos, tanto juiz quanto desembargadores entenderam que o empregado não estava mais trabalhando, nem sequer estava aguardando ordens do patrão. Assim, não seriam horas trabalhadas, e, por isso, o pedido foi negado.

Mas assim não entendeu o TST (Tribunal Superior do Trabalho)…

  Em terceira instância, o Tribunal Superior do trabalho entendeu diferente. Ao longo dos anos, a jurisprudência (conjunto de decisões reiteradas sobre um mesmo assunto) desse tribunal passou a enteder que o tempo utilizado pelo empregado para a troca de uniforme, laches e higiene pessoal deve ser considerado como tempo  à disposição do empregador. Para tal entendimento, fundamentou seu posicionamento através das regras dos artigos  58, §1º e art. 4º da CLT, assim como entendimento das súmulas 366, do próprio TST, mais aplicação analógica da Orientação Jurisprudencial 36 da SBDI-1. Em outras palavras, passaram a entender da seguinte forma: o tempo gasto com higienização,  lanches e troca de uniforme deve ser considerado tempo à disposição do empregador, portanto que não ultrapassem os limites do “tempo de tolerância”. Para compreensão da decisão, necessária a abordagem de dois temas: o tempo de tolerância e o tempo à disposição do empregador.

 O chamado ” tempo de tolerância”

   Muitas empresas informam seus funcionários sobre o “tempo de tolerãncia”. Esse tempo realmente existe, podendo favorecer tanto o empregador quanto o empregado. No caso desta postagem, também deve ser avaliado se o tempo de tolerância havia, ou não, sido desreseitado. Vejamos como funciona.

    O funcionário (assim como a empresa) possui dez minutos de tolerância diários, devendo ser respeitado o máximo de cinco minutos por vez que se registrar o ponto. Consideremos que o funcionário registre o ponto em quatro momentos: 1. quando vai começar sua jornada de trabalho, 2. antes de sair para o intervalo de refeição, 3. quando retorna do trabalho, e 4. quando encerra sua jornada de trabalho. Se o funcionário se atrasar alguns minutos a cada vez que for bater o ponto, por exemplo, chegando mais tarde para o início da jornada, ou voltando atrasado do almoço, etc., não necessariamente os minutos lhe serão descontados. Ele possui a tolerância de cinco minutos por cada vez que for registrar o ponto. Porém, o total de pequenos atrasos não pode ultrapassar dez minutos diários. Se ultrapassar, não só o que ultrapassar, mas todo o tempo atrasado será descontado. Para simples visualização, vamos ao exemplo: funcionário chega quatro minutos atrasado para o início da jornada. Retorna do almoço três minutos depois do horário devido. E encerra sua jornada cinco minutos antes do horário certo. Ele não ultrapassou cinco minutos em nenhuma delas, mas, somando, foram doze (12) minutos de atraso (4+3+5). Serão descontados os doze (12) minutos naquele dia.  Se a soma resultasse em no máximo dez (10) minutos, então nada seria descontado.

   Da mesma forma, se em vez do funcionário chegar atrasado, chegar mais cedo, ou mesmo ir embora mais tarde, os minutos não serão contadas como extras. Por isso apontamos acima que a tolerância serve tanto o empregado quanto o empregador.

   No caso em tela, o TST não ignorou esta regra. Pelo contrário, a ressaltou com os fundamentos legais mencionados. E mais, acabou por definir que esse tempo de tolerância deve ser respeitado, ou seja, não deve ser nem descontado, nem remunerado como horas extras, mesmo que ocorra posteriormente ao registro do ponto. Assim, mesmo o mecânico lavando-se depois que bateu o ponto, encerrando sua jornada, foi analisado se este tempo de higienização respeitava o tempo de tolerância.

   Pelas regras apontadas, foi confirmado que este tempo, cerca de trinta minutos diários, ultrapassam o tempo de tolerância. Conforme explicado, uma vez ultrapassado o tempo de tolerância, todo o tempo além do horário normal deverá ser remunerado como extra. Portanto, por dia, ao mecânico foi garantido o recebimento de trinta minutos a mais trabalhados, a serem remunerados com adicoinal de horas extras.

Mas o que é “tempo à disposição do empregador”?

   E então, surge a inevitável pergunta: se o mecânico já tinha batido o cartão de ponto quando começava a se lavar, como pode o tempo se lavando ser considrado tempo à disposição do empregador? Ele não iria mais voltar a trabalhar e não era forçado a se lavar na empresa… Portanto, não seria o mesmo que estar fora da empresa?

  Muito embora a pergunta seja pertinente, a resposta é não. O chamado “tempo à disposição do empregador” vem ganhando conotações mais amplas nos últimos anos.

  Discorreremos, na próxima postagem, sobre o “tempo à disposição do empregador”, buscando demonstrar que a expressão vai muito além do que a interpretação gramatical, estabelecendo importante tutela ao empregado e relevantes obrigações ao empregador.

  Fiquem ligados!

  E vamos em frente!

Buscando Direitos – A luta diária da advocacia

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